Ramon Gouvêa Ferreira

Na primeira metade dos anos 80 viajei muito para analisar e acompanhar projetos, juntamente com os colegas do velho DEALC (depois DEENE) de tão boas recordações.

Foi no tempo em que o BNDES se empenhou na multiplicação rápida das destilarias de álcool por todo o país, conforme preconizava o Proálcool.

De certa feita estava em Itaúnas, ao norte do Espírito Santo, na companhia de uma colega advogada.

Não tive tempo de pedir-lhe autorização para citar seu nome neste relato. Porém, fico muito à vontade para descrever-lhe a característica de pessoa muito humana, vivamente atenta às questões que envolvem a cada um em torno de si. Pessoa ativa e plena de afetividade.

Amanheceu o dia do retorno da viagem e, desde o café da manhã, ainda no hotel, eu a chamava de Natércia, que não tem nada a ver com o seu nome.

Ela se intrigava e perguntava onde fui buscar um nome tão raro e diferente. Eu explicava que Natércia era uma amiga muito especial, de quem sempre gostei muito, minha madrinha de casamento e minha comadre, madrinha do meu filho. E nos divertíamos quando eu lhe explicava que estava apenas fazendo uma transferência de afeto.

Então, ela já não se importava com a confusão e eu não tinha a menor preocupação em chamá-la pelo nome correto.

E assim foi o dia inteiro, durante a visita à empresa e na viagem de volta a Vitória, onde estivemos trabalhando com os técnicos do BANDES, parceiro do BNDES na operação de financiamento objeto de nosso trabalho.

Exaustos, seguimos para o aeroporto, ansiosos em por um ponto final na viagem. Era um fim de tarde de sexta-feira.

Aeroporto repleto, vôos lotados.

Houve um início de tumulto quando informaram sobre uma pane na aeronave que viria para o Rio. Não se sabia ainda o que seria feito. Ainda estava sendo buscada uma solução.

Não é difícil imaginar o burburinho e o clima de insatisfação predominante. Nenhum dos passageiros, incluindo nós dois, estava disposto a ficar ali para o fim de semana.

A empresa de aviação propôs organizar grupos e levar todos para jantar em restaurantes da cidade.

E efetivamente o fez. A colega afetuosa-e-sempre-pronta-a-auxiliar-a-quem-estivesse- próximo pôde mais uma vez exercitar essa sua verve...

Uma senhora se aproximou de nós por se sentir desprotegida. Seu filho a havia deixado no aeroporto e partira, após o check in, para a cidade de origem. Ela se sentia sozinha e insegura.

Foi um "prato cheio" para o espírito de proteção e solidariedade que tem nossa colega.

A senhora, então, se mostrou muito agradecida; sentiu-se acolhida, amparada e muito à vontade. Confessou que desde cedo estava preocupada, que durante todo o dia temia ficar sozinha e estava certa de que precisaria companhia pois poderia ocorrer um imprevisto.

O que ela não sabia, entretanto, é que nos deixaria intrigados, surpresos, perplexos ao estender a mão e formalizar a apresentação, dizendo:

- É muito bom ficar com vocês. Muito obrigada.

Meu nome é ... Natércia!



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